Frequentemente tratada como uma mera etapa de verificação de certidões e documentos, a due diligence jurídica, no contexto de uma operação de M&A, vai muito além desse papel superficial. Trata-se de etapa estratégica, com impacto direto na precificação do ativo, na estruturação da transação e, em última instância, na segurança jurídica do negócio como um todo.
Logo nas fases iniciais do processo, dois riscos relevantes costumam se apresentar. O primeiro decorre de abordagens genéricas, materializadas em checklists padronizados e desconectados da realidade da empresa-alvo. Não é incomum o recebimento de listas extensas de documentos e tópicos irrelevantes, o que não apenas onera indevidamente o target[1] — consumindo tempo e energia em demandas dispensáveis — como também compromete a efetividade da análise, ao deixar de tratar adequadamente temas que de fato exigem atenção prioritária do buy side[2].
Esse cenário, por sua vez, costuma decorrer do segundo risco:
Embora, num primeiro momento, essa delegação possa representar economia de custos, na prática tal escolha pode ser profundamente prejudicial.
A due diligence é, essencialmente, um exercício técnico e minucioso de identificação, mensuração e avaliação de riscos jurídicos. Trata-se de uma atividade que exige visão crítica, experiência multidisciplinar e profundo conhecimento jurídico e negocial, características que, por óbvio, não se esperam de profissionais em formação, sem a devida assistência ou orientação de um especialista.
Mais do que analisar a forma, é indispensável que a due diligence se atenha à substância e essência das matérias. Documentos formalmente corretos podem esconder riscos jurídicos, que apenas detentores de conhecimento técnico e com experiência prática suficiente poderão revelar, para, assim, identificar anomalias estruturais em contextos aparentemente regulares.
É relativamente comum empresas que sustentem essa regularidade com base em planejamentos fiscais excessivamente agressivos ou juridicamente frágeis. Ainda que formalmente adimplentes com suas obrigações tributárias, inclusive munidas de todas as certidões negativas de débitos. A detecção desses riscos exige sensibilidade para distinguir o uso legítimo da elisão fiscal de estruturas artificiais que podem ser desconsideradas pelo Fisco.
Essa lógica se estende a outras áreas do Direito: societária, contratual, trabalhista, regulatória, ambiental etc. Mesmo temas aparentemente simples podem ocultar riscos relevantes. Por isso, é essencial que o time responsável pela due diligence tenha capacidade de leitura crítica e visão integrada. Desse modo, conectando aspectos jurídicos com os desdobramentos econômicos da transação.
Essas análises, por sua vez, não servem apenas para informar: elas determinam a estrutura da operação. A forma de endereçar os riscos identificados depende diretamente da qualidade do diagnóstico jurídico realizado. Seja por meio de ajustes de preço, cláusulas suspensivas, mecanismos de compensação, escrows ou condições pós-closing.
A due diligence, portanto, é a atividade que resulta em um documento matriz a partir do qual se constrói a cláusula de declarações e garantias (representations and warranties no jargão em ingês), instrumento contratual de alocação de responsabilidades que deve refletir, de maneira precisa, o mapeamento dos riscos levantados. Mais uma vez, a presença de profissionais experientes é indispensável. Isso porque, são eles que têm condições técnicas e estratégicas de traduzir os achados da auditoria em instrumentos contratuais eficazes, que sejam juridicamente válidos, economicamente equilibrados e exequíveis na prática.
Em síntese, a qualidade da due diligence, na forma como é conduzida, interpretada e transposta para o contratodefine a robustez jurídica da operação. Não existe contrato bem estruturado sem uma diligência bem feita. Tampouco existe cláusula de garantia eficaz sem a correta identificação e alocação dos riscos. A prática demonstra que a maioria dos litígios pós-M&A não decorre da ausência de cláusulas, mas sim da superficialidade com que avaliaram e endereçaram os riscos. É justamente por isso que o envolvimento de profissionais sêniores, desde o diagnóstico inicial até a negociação final, não é apenas recomendável, é imprescindível.
Essa constatação conduz a uma conclusão inescapável: a due diligence jurídica não é uma etapa burocrática. É um ato central de estratégia, inteligência e proteção patrimonial em qualquer operação de M&A.
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[1] Termo usualmente utilizado para identificar a sociedade ou ativo alvo da operação.
[2] Termo que identifica a parte interessada em adquirir o ativo ou sociedade alvo da operação.
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Autor: Gustavo Braga
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