26/08/2025

Compartilhamento de dados da UIF (antigo COAF) com autoridades de investigação: o que as empresas precisam saber

O Conselho de Controle de Atividades Financeiras (COAF), atualmente denominado Unidade de Inteligência Financeira (UIF), é o órgão responsável por receber, examinar e identificar ocorrências suspeitas de atividades ilícitas no sistema financeiro.

O UIF/COAF atua como centro de inteligência, processando informações enviadas por instituições financeiras e outros setores regulados, com o objetivo de prevenir e combater crimes como lavagem de dinheiro, corrupção e financiamento ao terrorismo. Sua função estratégica consiste na produção de Relatórios de Inteligência Financeira (RIFs), com base na identificação de indícios de irregularidades, os quais são posteriormente encaminhados às autoridades competentes, como o Ministério Público e as Polícias Judiciárias, em observância aos parâmetros legais de sigilo e formalidade.

O que as empresas precisam entender sobre o compartilhamento de dados pelo UIF/COAF?

O compartilhamento de dados pelo UIF/COAF com autoridades de investigação, sem prévia autorização judicial, tornou-se um dos temas mais relevantes do compliance penal corporativo. Empresas precisam compreender como essa prática afeta diretamente a gestão de riscos, a conformidade regulatória e a resposta a investigações. O desconhecimento do tema pode levar a bloqueios de ativos, prejuízos financeiros e danos irreparáveis à reputação. No cenário atual, a postura preventiva deixou de ser uma opção para se tornar necessidade de gestão estratégica.

O Supremo Tribunal Federal (STF) consolidou, no julgamento do Tema 990 da Repercussão Geral, que é constitucional o compartilhamento de RIFs pelo UIF/COAF sem autorização judicial, desde que respeitados o sigilo, a existência de procedimento formalmente instaurado, a comunicação documentada e a possibilidade de controle judicial posterior. O STF deixou claro que esse entendimento vale tanto para comunicações espontâneas do UIF/COAF quanto para solicitações formais feitas por autoridades de investigação, considerando que tais relatórios não configuram quebra de sigilo bancário indiscriminada, mas sim transferência controlada de informações já filtradas. Assim, o modelo brasileiro de inteligência financeira foi legitimado como instrumento eficaz para subsidiar investigações complexas.

Apesar disso, o Superior Tribunal de Justiça (STJ), em decisão recente da Terceira Seção, restringiu a prática ao afirmar que o Ministério Público e a polícia não podem requisitar diretamente relatórios ao UIF/COAF sem ordem judicial, admitindo apenas o compartilhamento espontâneo. Essa divergência de interpretação entre os tribunais superiores tem gerado insegurança jurídica, pois provas obtidas com base em requisições formais — consideradas válidas pelo STF — podem ser anuladas no STJ, criando instabilidade em investigações e processos. Empresas devem estar atentas a esse cenário, pois ele influencia diretamente estratégias de defesa e compliance.

Há algum impacto para as empresas?

O impacto para o setor corporativo é evidente. Operações financeiras atípicas, incompatíveis com o perfil de determinada empresa, podem gerar comunicações automáticas pelas instituições financeiras e, em seguida, relatórios enviados ao UIF/COAF e deste às autoridades. Este fluxo pode resultar em medidas cautelares severas, como bloqueio de contas, busca e apreensão de documentos e restrições contratuais, muitas vezes antes mesmo de os investigados serem sequer ouvidos. A resposta inadequada ou tardia a tais situações pode gerar ou agravar danos e comprometer a continuidade do negócio.

Nesse contexto, cabe às empresas adotar uma postura preventiva robusta. O fortalecimento de programas de compliance penal, com políticas claras de monitoramento transacional, revisão criteriosa de parceiros comerciais e capacitação de áreas sensíveis – como financeira e comercial -, é medida fundamental. A identificação e a mitigação de riscos antes que transações suspeitas sejam registradas pelo sistema financeiro reduzem consideravelmente a exposição a investigações e medidas restritivas. Além disso, manter canais formais de diálogo com órgãos de investigação, assessorados por consultoria jurídica especializada, permite responder de forma estratégica e nos limites legais.

Em conclusão, o compartilhamento de dados pelo UIF/COAF é uma realidade jurídica consolidada no STF, de aplicação imediata, e que exige atenção redobrada do setor empresarial. Antecipar-se por meio de políticas preventivas, avaliar continuamente o perfil transacional e contar com suporte jurídico especializado são medidas essenciais para preservar integridade operacional e reputacional. O cenário recomenda que empresários e departamentos jurídicos revisem seus procedimentos internos e adotem boas práticas de compliance, assegurando não apenas a conformidade legal, mas também a resiliência frente a investigações cada vez mais sofisticadas.


Autor: Vinicius Papa Soares

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