A Emenda Constitucional nº 132/2023, que consolidou a tão debatida reforma tributária, trouxe profundas alterações na estrutura de tributação brasileira, com impacto direto sobre o planejamento patrimonial e sucessório, especialmente no contexto do agronegócio. A conjugação de normas que visam simplificar tributos sobre o consumo com mudanças paralelas nos regimes de transmissão patrimonial exige atenção redobrada por parte das famílias rurais.
Um dos pontos mais sensíveis da reforma, em relação ao patrimônio, foi a obrigatoriedade da progressividade das alíquotas do ITCMD (Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação), conforme o novo §1º do art. 155 da Constituição Federal, com redação dada pela EC 132/2023. Agora, os estados não apenas podem, mas devem adotar um modelo progressivo, o que, na prática, aumentará significativamente a carga tributária sobre heranças e doações de maior valor.
Além disso, a reforma impôs a necessidade de que a base de cálculo do ITCMD seja o valor de mercado dos bens transmitidos, o que acaba com a prática comum – especialmente no meio rural – de realizar doações com reserva de usufruto utilizando valores históricos (muitas vezes subavaliados) para fins de redução da tributação.
Entretanto, é importante destacar a mobilização bem-sucedida da Federação das Indústrias do Estado de Mato Grosso (FIEMT), que, em interlocução direta com o governo estadual, conseguiu preservar temporariamente a sistemática anterior de apuração da base de cálculo do ITCMD. Com isso, o Estado do Mato Grosso ainda admite, em determinadas situações, a avaliação dos bens com base em critérios menos onerosos, dando aos contribuintes uma última janela de reorganização patrimonial antes da vigência plena das novas exigências constitucionais.
Outro ponto de inflexão trazido pela reforma diz respeito à incidência do ITCMD sobre planos de previdência privada, como PGBL e VGBL. A jurisprudência anterior era favorável à não incidência do imposto nessas hipóteses, por se tratar de valores com natureza securitária e não de herança propriamente dita. Contudo, a nova redação constitucional e os projetos de leis complementares já em tramitação preveem a incidência do ITCMD sobre esses ativos, exigindo reavaliação de planejamentos que envolvam esse tipo de instrumento.
Diante deste novo cenário, ganha ainda mais força o uso de estruturas societárias como holdings familiares, especialmente na forma de sociedades limitadas ou anônimas com objeto patrimonial. Tais estruturas permitem, por meio da integralização de bens rurais como capital social, uma organização eficiente do patrimônio, o estabelecimento de regras claras de governança e sucessão, e uma mitigação dos impactos tributários mediante doações de quotas com reserva de usufruto, enquanto a legislação vigente ainda o permite.
Adicionalmente, estruturas como os Fundos de Investimento nas Cadeias Produtivas Agroindustriais (Fiagro) despontam como alternativas modernas para reorganizar ativos rurais, com benefícios fiscais e maior liquidez. O uso do Fiagro como ferramenta de sucessão, embora ainda em desenvolvimento, já tem sido estruturado com cláusulas de restrição à negociação de cotas, assegurando a continuidade dos empreendimentos familiares.
Por fim, é preciso lembrar que o planejamento sucessório exige não apenas atos formais, mas efetividade. Estruturas simuladas ou criadas apenas para redução fiscal, sem operação real, governança ativa e documentação contábil e jurídica consistente, serão facilmente desconsideradas pelo fisco, à luz dos princípios da boa-fé objetiva e da vedação ao abuso de forma.
Assim, o momento exige ação imediata. Com a transição prevista para os próximos anos, cada mês representa uma oportunidade de antecipar, com segurança jurídica, medidas de proteção e continuidade do patrimônio rural familiar. A reforma tributária não apenas altera a forma de tributar: ela redefine as bases do planejamento sucessório no Brasil, sobretudo no campo.
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Autor: Gustavo Fernandes Cordeiro
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